“Estimular os bebês é um equívoco”
Paulo Fochi, coordenador e professor do curso de especialização
em Educação Infantil da Unisinos, no Rio Grande do Sul
em Educação Infantil da Unisinos, no Rio Grande do Sul
Os bebês não precisam de estímulos constantes. São curiosos por 
natureza e, para que se desenvolvam em plenitude, ações simples, como 
providenciar um ambiente seguro são suficientes. O pedagogo e educador 
Paulo Fochi é categórico ao criticar modismos na educação infantil. Para
 ele, o maior desafio é planejar a educação infantil a partir das 
necessidades dos bebês. “A produção de conhecimento tem de ser feita de 
uma forma que tenha sentido para a criança. Há uma tendência atual muito
 forte para estimular bebês e isso é um equívoco do meu ponto de vista.”
No início de novembro, Fochi conquistou a plateia formada por 
educadores no 7.º Seminário Municipal de Educação Infantil, em 
Curitiba, com sua visão sobre o tema. Por telefone, ele conversou com a 
Gazeta do Povo: 
Qual é o maior problema que observa na educação infantil?
Compartilho com os estudos que indicam que o grande desafio para a 
educação infantil, para as crianças de zero a 6 anos, está em descobrir 
como é ser professor sem dar aula, presente também nas Diretrizes 
Curriculares Nacionais. Mas é preciso atentar que isso não significa 
deixar a coisa acontecer espontaneamente. A produção de conhecimento tem
 de ser feita de uma forma que tenha sentido para a criança. Há uma 
tendência atual muito forte para estimular bebês e isso é um equívoco do
 meu ponto de vista. 
Quais estímulos são equivocados? 
Você já deve ter visto diversas coisas do tipo: o adulto coloca o 
bebê de barriga para baixo para que seu corpo fique firme para quando 
for caminhar. Há uma ação para fazer o bebê caminhar mais cedo. 
Misteriosamente, depois que ele caminha, os pais querem que ele fique 
sentado, parado, em um cadeirão. O mesmo acontece com falar. Já vi 
professoras passando batom vermelho na boca e falando, com a boca bem 
aberta, de forma exagerada, na frente do bebê, com a intenção de 
estimular a fala. Mas, quando ele começa a falar demais, os adultos 
pedem para ficar quieto. Há uma esquizofrenia em casa e na escola. Dão 
carrinhos, coisa com som, que fala, que pisca, para que, dois ou três 
anos depois, seja necessário procurar um médico para perguntar: como 
posso acalmar meu filho? E aí o médico receita medicamentos. Tenho uma 
premissa que a gente tem que dar tempo para o bebê ser bebê. Cada fase 
deve ser respeitada. Há uma tendência de se criar academia para bebês ou
 sites que estimulam o ensino de Matemática quando ele ainda está em 
gestação. Estão criando agenda, aula disso, daquilo. Está entendendo a 
loucura?
Quais são as particularidades dos bebês? 
As descobertas do mundo que o bebê faz em um mês valem uma década na 
vida de um adulto. O adulto não precisa ficar na frente da criança 
sacudindo um chocalho freneticamente ou falando de forma abestada. O 
bebê é curioso para descobrir o mundo, basta dar condições para que 
descubra. Isso implica que ele fique no chão, não naqueles balanços 
horrorosos. Não precisa estimular, basta garantir formas de ele fazer 
isso, proporcionar o que se chama de entorno positivo. O espaço que ele 
fica, em sala, ou em casa, não deve ser grande, nem pequeno demais, mas 
suficiente para circular. Tem que ser seguro, sem a necessidade de um 
adulto em volta, falando: ‘não faz isso’, ‘não faz aquilo’. O adulto 
deve se manter no campo visual e auditivo da criança, sustentando-a 
emocionalmente com sua presença, mas sem interromper ou intervir nas 
experiências dela. É preciso ter desafios para a criança, aos quais ela 
se dedicará quando aquilo se configurar como um desafio.
Como por exemplo...
Uma caixa no meio da sala, que faz um degrau. O bebê vai subir e 
descer engatinhando, quando estiver pronto para aquilo. Isso promove a 
descoberta de seu corpo, que vai providenciar uma organização para 
executar a ação de caminhar. O entorno positivo exige materiais 
adequados. Que encaixam, que dão para empilhar, que cabem um dentro do 
outro. Não precisa ser da Fisher Price ou outra marca famosa. Caixas, 
potes. Isso dá possibilidade de a criança descobrir o mundo. 
Como convencer os pais que não é preciso tantos estímulos para os bebês terem um bom desenvolvimento?
Na verdade, os pais estão no direito de ignorância deles sobre o 
assunto. O que a gente precisa é de professores que tenham um argumento 
melhor que a Ana Maria Braga, entende o que digo? Os pais têm direito de
 achar interessante aquilo que a Ana Maria Braga mostrou para o neto 
dela, aquilo que a Adriane Galisteu fez para o filho dela, essas 
modinhas que aparecem no Facebook e na televisão. Quem tem que mostrar 
que isso não é benefício é a escola, o professor. Pensar o processo 
educativo nos primeiros anos de vida tem que ser processo de 
corresponsabilidade família e escola. Isso implica chamar os pais para o
 diálogo e mostrar o que é aprender na infância, qual o valor da 
experiência de vida dessas crianças. 
O ensino em período integral é benéfico para a criança? 
Se a escola for boa para a criança, sim. O ideal seria ficar um turno
 com a família, outro na escola. Mas as famílias não se organizam assim,
 a rotina de trabalho dos pais não é essa, independentemente se são 
ricas ou pobres. Então temos que pensar, nesse tempo em que as crianças 
estão na escola, 10, 12 horas, é preciso construir um processo educativo
 de qualidade. Não são dois turnos de trabalho, é outra relação. É 
preciso compreender que a experiência educativa, aprender a comer, o 
ritual do sono, o deslocar pela escola é uma grande aprendizagem, tem 
que ser pensada ao longo da jornada.  Depois, os pais precisam refletir 
como será o tempo que passarão com os filhos, que não pode ser mediado 
pela televisão. Que seja de encontro, conversa, carinho. 
Qual a maior dificuldade para termos o ensino infantil integral de qualidade?
Há um desafio financeiro, mas vai além disso. É um desafio 
conceitual. Precisamos mobilizar os gestores públicos para compreenderem
 o que é infância, o que é ser criança, numa fase anterior a essa 
proposta de financiamento, até para que o financiamento se dê de forma 
correta. 

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