Então não precisa
de legenda...
Para compreender e, principalmente, respeitar o desenho infantil, não basta apenas saber sobre as teorias do desenho, as fases de seu desenvolvimento ou significações psicológicas sobre o grafismo infantil; o educador precisa saber da sua própria produção, da sua expressão, da sua linguagem.
Para compreender e, principalmente, respeitar o desenho infantil, não basta apenas saber sobre as teorias do desenho, as fases de seu desenvolvimento ou significações psicológicas sobre o grafismo infantil; o educador precisa saber da sua própria produção, da sua expressão, da sua linguagem.
Onde está o seu desenho? Ainda o leva consigo ou foi deixado
no meio do caminho, entre a casa e a escola, entre a infância e a juventude?
Toda criança desenha, mas ao longo da vida, influenciada sobretudo pelos processos escolares, vai abandonando sua produção e então chega à vida adulta sem saber qual é o seu traço, qual é a sua marca. Vai perdendo a capacidade de designar, de afirmar-se produtora de sentidos, sujeito criador de mundos, pois o desenho é uma espécie de projeto, uma “[...] possibilidade de lançar-se para frente” (MOREIRA, 2002, p. 15).
Toda criança desenha, mas ao longo da vida, influenciada sobretudo pelos processos escolares, vai abandonando sua produção e então chega à vida adulta sem saber qual é o seu traço, qual é a sua marca. Vai perdendo a capacidade de designar, de afirmar-se produtora de sentidos, sujeito criador de mundos, pois o desenho é uma espécie de projeto, uma “[...] possibilidade de lançar-se para frente” (MOREIRA, 2002, p. 15).
Quem já não ouviu dizer que o desenho é linguagem, assim como o gesto e a fala?
Afirmar que desenho é linguagem, é compreendê-lo como produção carregada de significado.
Ao desenhar, a criança diz de si e do mundo que está conhecendo, descobrindo, desvendando:
“O desenho é a manifestação de uma necessidade vital da criança: agir sobre o
mundo que a cerca; intercambiar, comunicar” (DERDYK,1989, p. 51).
O desenvolvimento gráfico da criança não é linear. É repleto de idas e
vindas, avanços
e recuos, porque é justamente um processo. Desenhando, vai deixando suas
marcas no papel
ou em qualquer superfície disponível (as paredes, o chão) e, desta
forma, a criança vai contando
sua história, passando por um intenso processo existencial, de
transformações, em que
cognição e sentimento estão juntos, intimamente ligados. Segundo Derdyk:
A criança enquanto desenha canta, dança, conta histórias, teatraliza,
imagina
ou até silencia... O ato de desenhar impulsiona outras manifestações,
que acontecem juntas, numa unidade indissolúvel, possibilitando uma
grande caminhada pelo quintal do imaginário. (DERDYK, 1989, p.19).
Se o educador não compreende o desenho da criança como um processo de criação,
como linguagem que é, pode reforçar equívocos em sua prática, tais como a utilização do
desenho pronto para colorir (antigamente mimeografado, hoje, xerocado ou impresso) e da
cópia. Afinal, se “[...] a arte se define justamente pela diversidade, por propor algo que é
pessoal e único (...) temos que descartar toda atividade que tenha como ponto de partida a
uniformidade” (MOREIRA, 2002, p. 84).
Outro equívoco, muito comum na educação infantil, revela-se nas intervenções do
professor sobre o desenho da criança, seja escrevendo/nomeando com sua letra “o que” a
criança desenhou, seja dando aquela “ajeitadinha”, o “retoque final”, para a exposição, para
colocar na pasta, para mostrar aos pais... Equívoco, sim, pois na verdade temos aí a negação
do desenho como linguagem. Por quê? Ora, se o desenho é linguagem se constituindo que
expressa, comunica e diz de um processo vivido, deve valer por si mesmo e não pela “legenda”
que o professor coloca! A escrita sobreposta ao desenho, explicando o que é, corresponde
à linguagem e ao desejo do adulto, não das crianças; principalmente quando são pequeninas,
rabiscando, garatujando, experimentando o prazer do gesto, encantando-se com a mágica
das marcas produzidas com seu corpo no papel.
O adulto se esforça tremendamente para conseguir enxergar figuras nos
desenhos das crianças: ele tem dificuldades de permanecer “em suspensão”.
Sente uma necessidade imperiosa de nomear figuras, como se a figuração
fosse sinônimo de maturidade intelectual e habilidade motora.
(DERDIK, 1989, p. 141).
Parece que o adulto “não aguenta” o processo da criança, suas experimentações, seu
desordenamento, seus rabiscos... Em tudo, o adulto quer colocar ordem – a sua ordem –
nomear, enquadrar e, então, acaba por interferir indevidamente na produção das crianças.
Acaba por silenciar a voz da criança, restringindo seu processo de criação.
Se as crianças contam histórias ao desenhar, o adulto interessado por suas aventuras
poderá escrever (por exemplo, no verso do papel desenhado) a história do desenho, e não
palavras soltas, que buscam apenas identificar “as figuras”.
Se a criança assim o desejar e
permitir, esse momento pode ser uma oportunidade rica para o diálogo
contribuindo, inclusive,
para a estruturação do discurso oral da criança. A pergunta, “qual é a
história do seu
desenho?”, pode remeter o seu produtor a pensar sobre o processo e
organizar o pensamento
para expressá-lo. Porém, que isso não se transforme em mais uma
atividade didática! Como nos indica Edith Derdik (1989) há uma
identidade entre a criança e seu desenho,
no qual produção e produtor se fundem. Ao desconsiderarmos o desenho em
processo,
estaremos igualmente desconsiderando a criança, sua história, seus
sentimentos, seus
sonhos, suas experiências. Mais do que um exercício, o desenho como
produto é sua vida,
portanto, esta não pode ser desvalorizada.
Não é mesmo espantoso e radical mergulhar nessa concepção? O que pareceria um simples desenho, um rabisco apenas, bolinhas esparsas, indícios de esquemas, é toda uma vida! É preciso ter muito cuidado para não negarmos aos meninos e meninas esse espaço vital de criação e construção de pensamento.
Não é mesmo espantoso e radical mergulhar nessa concepção? O que pareceria um simples desenho, um rabisco apenas, bolinhas esparsas, indícios de esquemas, é toda uma vida! É preciso ter muito cuidado para não negarmos aos meninos e meninas esse espaço vital de criação e construção de pensamento.
Pensemos, agora, na organização dos tempos e espaços no cotidiano educativo: desenha-
se quando sobra tempo, não pode sujar a sala, acabou o tempo, recolhe a produção, só
tem lápis de cor e giz de cera, folha A4 de papel branco... E, depois disso, pretende-se que
as crianças “saibam desenhar” assim, de uma hora para outra.
Para aprender a desenhar, é preciso desenhar muito, sempre! A constância no fazer é
que vai consolidar novas aquisições nas formas da produção gráfica. Com diferentes materiais,
em diferentes suportes, com tamanhos diversos. A cada material, tamanho de papel,
por exemplo, será acionada uma nova experiência, colocando novas perguntas, propostas de
exploração, busca de respostas e soluções para essa produção.
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