O TRAÇO E O GESTO:
PESQUISANDO GARATUJAS
O desenho é um modo de expressão próprio da criança,
constitui uma língua que possui vocabulário e sua sintaxe. A criança explora o
mundo e interage com ele por meio dos desenhos, ao prazer do gesto associa-se o
prazer da inscrição, a satisfação de deixar a sua marca.
Ao final do seu primeiro ano de vida, a criança já é
capaz de manter ritmos regulares e produzir seus primeiros traços gráficos,
fase conhecida como dos rabiscos ou garatujas termo utilizado por Viktor
Lowenfeld para nomear os rabiscos produzidos pela criança.
Partindo destas descobertas iniciais, outros autores
com Rhoda Kelogg, Edyth Derdyk, entre outros, investigaram as garatujas e
primeiras explorações gráficas das crianças, com o objetivo de compreender este
amplo e rico repertório.
Kellog propõe uma vasta análise das garatujas,
definindo-as com tijolos construtores dos futuros desenhos figurados das
crianças. Ela levanta uma série de 20 rabiscos básicos que se evoluem em
traçados e desenhos.
O desenvolvimento progressivo do desenho implica
mudanças significativas que, no início, dizem respeito à passagem dos rabiscos
iniciais da garatuja para construções cada vez mais ordenadas, fazendo surgir
os primeiros símbolos .
Essa passagem é possível graças às interações da
criança com o ato de desenhar e com desenhos de outras pessoas. Na garatuja, a
criança tem como hipótese que o desenho é simplesmente uma ação sobre uma
superfície, e ela sente prazer ao constatar os efeitos visuais que essa ação
produziu.
No decorrer do tempo, as garatujas, que refletiam
sobretudo o prolongamento de movimentos rítmicos de ir e vir, transformam-se em
formas definidas que apresentam maior ordenação, e podem estar se referindo a
objetos naturais, objetos imaginários ou mesmo a outros desenhos. Na evolução
da garatuja para o desenho de formas mais estruturadas, a criança desenvolve a
intenção de elaborar imagens no fazer artístico.
Começando com símbolos muito simples, ela passa a
articulá-los no espaço bidimensional do papel, na areia, na parede ou em
qualquer outra superfície. Passa também a constatar a regularidade nos desenhos
presentes no meio ambiente e nos trabalhos aos quais ela tem acesso,
incorporando esse conhecimento em suas próprias produções.
No início, a criança trabalha sobre a hipótese de que
o desenho serve para imprimir tudo o que ela sabe sobre o mundo. No decorrer da
simbolização, a criança incorpora progressivamente regularidades ou códigos de
representação das imagens do entorno, passando a considerar a hipótese de que o
desenho serve para imprimir o que se vê.
É assim que, por meio do desenho, a criança cria e
recria individualmente formas expressivas, integrando percepção, imaginação,
reflexão e sensibilidade, que podem então ser apropriadas pelas leituras
simbólicas de outras crianças e adultos.
Com base nestas informações, elaboramos uma sequência
didática que explora diferentes formas de trabalho com a linguagem gráfica para
crianças bem pequenas, convidando-as a ampliar seu repertório, experimentar e
assim realizar seu potencial.
Por meio destas propostas, o professor poderá também
compreender e acompanhar o percurso gráfico de seus alunos, testemunhando
significativas situações de encontro que podem contribuir para o nascimento de
uma importante relação: das crianças com seus desenhos.
Faixa etária: 0 a 3 anos
Conteúdo: artes visuais/percepção de si e ou outro
Objetivos:
- Inaugurar uma prática de desenho sistematizada com os pequenos
- Ampliar o universo cultural
- Explorar as possibilidades de trabalho com diferentes materiais
Conteúdos:
- Manuseio de materiais
- Ampliação do repertório motor/ desenhos
- Noções de causalidade
Tempo estimado: 2 meses, com possibilidade de
incorporação da prática (com variações) como atividade permanente
Materiais necessários: papéis grandes e pequenos em
diferentes formatos, giz de cera, lápis de cor grosso, lápis 6B, carvão,
tijolinhos de giz de cera, caneta hidrocor grossa/ fina, lixa, barbante,
caixinhas de fósforo, palitos de dente/ churrasco, pedaços de tecido.
Organização do espaço: as atividades podem ser
realizadas em sala ou em outros espaços. É importante disponibilizar uma parede
ou mural ao alcance das crianças para a visualização/apreciação dos trabalhos.
Cada criança também precisará de uma caixa ou pasta grande para armazenar suas
produções.
Desenvolvimento das atividades:
Comece a sequencia levantando uma bibliografia básica
sobre o assunto. Se seu grupo já realiza atividades de desenho, faça uma
observação cuidadosa das produções, buscando regularidades nos traçados das
crianças.
É possível identificar regularidades?
Como são traços?
E a ocupação
do espaço do papel?
Proponha uma primeira atividade em que as crianças
farão 3 desenhos: papel Kraft em formado circular grande, +- 60cm de diâmetro,
outro na metade deste, e outro bem pequeno 10 cm diâmetro. Comece
oferecendo o papel maior e vá substituído pelos outros.
Retome a atividade com o circulo de tamanho médio e
avalie como ficaram as produções.
Proponha outra atividade com o circulo vazado no meio,
mais uma vez em 3 tamanhos.
Explore então diferentes formatos como tiras de papel
na vertical, papéis com recortes numa das extremidades com ou aplicações
(pedaços de barbante, palitos, lixa, etc)
Aprecie sempre com as crianças os efeitos de seus
traçados.
Pesquise com eles artistas que trabalham com o
desenho- Picasso (desenho numa linha só, por exemplo)
Exponha as produções em sala
Fotografe as etapas do trabalho e retome com as
crianças os materiais utilizados e seus efeitos sobre os suportes.
Avaliação
Faça a avaliação ao longo de todo o processo. Planeje
algumas paradas para observar com colegas que trabalham com crianças mais
velhas as produções dos pequenos. É possível identificar traçados que podem se
transformar em desenhos do futuro? Procure localizar os “rabiscos básicos” de
Rhoda Kellog nas produções das crianças. proponha situações de desenho livre e
observe se como as crianças produzem nestas situações.
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