Planejar para aprender.
Aprender para planejar.
Beatriz Ferraz
Frente ao
desafio de escrever um artigo sobre o planejamento na Educação Infantil, me vi
inquieta buscando uma forma de introduzir este tema de maneira agradável e com
a devida valorização que merece. Poderia iniciar escrevendo sobre a importância
do planejamento na ação do educador, mas achei que não seria uma boa
alternativa já que esta
é uma afirmação tão conhecida.
Por onde
começar? Começo, então, por um registro de uma educadora que relata a contribuição
que a prática de planejar trouxe para a sua ação educativa junto às crianças.
“Trabalho
com uma turma de crianças de 4 anos e pretendia realizar com elas um estudo
sobre peixes. O exercício de planejar a atividade que despertaria nas crianças
o interesse pelo tema foi de fundamental importância para que eu pudesse rever
tudo o que estava imaginando fazer. A primeira atividade representaria o grande
disparador para o trabalho que faríamos.
Senti uma
profunda necessidade de pensar como o projeto deveria ser realizado. Então
sentei e escrevi um planejamento:
Nome da
atividade:
Quais os
peixes que queremos estudar.
Contexto
da atividade: Conversa
para iniciar um estudo com as crianças sobre alguns peixes.
Objetivo
da atividade (o que quero que as crianças aprendam):
-
Escolher os peixes que gostariam de estudar;
-
Levantar algumas perguntas que gostariam de ver respondidas sobre os peixes escolhidos;
- Indicar
alguns materiais que poderíamos usar para buscar informações.
Conteúdo
da atividade (o que preciso ensinar):
-
Elaboração de perguntas;
- Fontes
de informação;
- Nome de
alguns peixes.
Encaminhamento
da atividade (como desenvolver a atividade com as crianças):
Levar
para a roda alguns livros com imagens de peixes.
Perguntar
às crianças quais peixes conhecem e, desses, quais gostariam de estudar. Listar
em uma folha os peixes sugeridos pelas crianças e, se for o caso, fazer uma
votação para escolhermos alguns.
Perguntar
a elas o que gostariam de saber sobre estes animais. E, por fim, perguntar às
crianças onde poderíamos encontrar informações para responder as perguntas. Estava
muito satisfeita com o meu planejamento! A minha surpresa foi quando iniciamos
o projeto e as coisas não saíram como o esperado!
Quando
mostrei os livros para elas e perguntei quais peixes elas queriam estudar, apontavam
aleatoriamente as imagens de peixes dos livros. Sendo assim, iam virando as
páginas e dizendo que queriam saber sobre todos eles! Além disso, quando
perguntei o que queriam saber, me disseram coisas como “Quantos olhos eles têm?
Ele tem boca?...”. E ainda para finalizar, quando perguntei sobre onde encontro
as informações, me disseram que poderia ser nestes livros mesmo que eu havia
levado. Fiquei super frustrada!
Senti que
as crianças não se envolveram, que não se comprometeram com a minha proposta e
que estavam respondendo às minhas perguntas sem muita consideração, esperando
que aquela atividade acabasse logo e que pudessem ir brincar. Depois de
muito lamentar, tomei uma decisão: voltar ao meu planejamento e pensar o que
tinha de errado para produzir tal desastre!
Foi
justamente nesta retomada que me dei conta de algumas coisas:
1. Se
pretendia fazer uma atividade que despertasse o interesse, era importante que o
foco dela estivesse em uma motivação. Sendo assim, não poderia ter como objetivo
que as crianças aceitassem prontamente a minha proposta e a partir daí
respondessem a todas as minhas solicitações. Pude perceber que no planejamento
não estava considerando as características do pensamento infantil e, portanto,
não havia conseguido fazer uma boa condução da atividade de modo que ficassem
interessadas na minha proposta.
2. Também
pude me dar conta de que para que as crianças pudessem formular boas perguntas
que justificassem uma busca de informações em diferentes fontes era importante
que elas pudessem primeiro saber algo sobre os peixes e a partir deste
conhecimento poderiam levantar suposições ou mesmo comparações entre as
informações que tinham gerado o interesse por novos conhecimentos. As perguntas
que as crianças fizeram podiam ser respondidas com uma simples observação das imagens
dos livros e este era um equívoco meu de não considerar que eu precisava
ajudá-las a formular questões e, para isso, precisaria fazer alguma atividade
que as ajudassem nesta tarefa.
Com estas
constatações fui buscar ajuda das minhas colegas de trabalho e de minha
diretora para pensar em outra atividade que pudesse gerar melhores resultados.
A partir das sugestões que recebi, passei um vídeo que falava sobre o fundo do
mar apresentando alguns peixes e algumas informações sobre eles. As crianças
adoraram e ficaram completamente envolvidas com as imagens e as informações que
receberam. Quando terminamos de assistir, tinham muita clareza dos peixes que
queriam pesquisar e tinham perguntas muito interessantes, que puderam conceber
a partir daquilo que viram e ouviram.
Perguntaram
coisas como:
“Porque o
peixe espada tem este nome?”; “Quantas pernas tem o polvo?”, “Por que tem peixe
que come peixe? Os peixes ficam grávidos?” Agora sim, tínhamos perguntas que
precisavam de uma pesquisa para serem respondidas.
Fiquei
muito contente com o novo rumo que tomou meu trabalho com as crianças. Sei que
foi graças ao planejamento feito e depois reelaborado que pude aprender coisas tão
importantes sobre a relação ensino-aprendizagem e principalmente, sobre as boas
ações do educador que favorecem aprendizagens significativas às crianças!”
A
reflexão desta educadora sobre o uso do planejamento como um instrumento que nos
ajuda a adequar melhor nossas ações e com isto propiciar uma aprendizagem de qualidade
às crianças nos traz muitas informações sobre o quê significa planejar, paraque
planejar e como planejar.
Também
aprendemos que o planejamento favorece a reflexão sobre a prática educativa
A
primeira questão que podemos aprender com ela é que o planejamento precisa fazer
sentido para o professor, pois ele é um instrumento que visa ajudar e facilitar
a sua prática. Ao planejar, antecipamos uma série de acontecimentos que podem ocorrer
na ação e nos preparamos para lidar com eles, diminuindo assim a quantidade de
imprevistos e tornando as nossas ações mais precisas e de melhor qualidade.
Também
aprendemos que o planejamento favorece a reflexão sobre a prática educativa e,
dessa forma, funciona também como um instrumento de aprendizagem. Quando
planejamos, tomamos uma série de decisões e fazemos uma série de relações entre
conhecimentos teóricos/científicos e conhecimentos práticos de nossa
experiência pessoal e profissional. Vejamos alguns exemplos:
A frase
inicial do item 1 deve ser mantida pois ela explicita bem a idéia que a autora
quer marcar.
1. A partir
do plano curricular da instituição, que ajuda o professor a guiar sua prática
com as crianças, ele escolhe, durante o planejamento, quais as melhores
estratégias para colocar em ação cada um dos conteúdos que pretende ensinar.
2. Ao realizar
o exercício de pensar sobre as estratégias e os conteúdos de ensino, o
professor precisa pensar sobre quem é a criança com a qual trabalha, quais são
as suas necessidades, seus interesses, suas motivações.
A partir
desta reflexão terá maior clareza em seu planejamento para decidir o encaminhamento
da atividade.
3. Ao
considerar como irá conduzir uma atividade e quais os conhecimentos que
pretende ensinar, exercício propiciado pelo planejamento, o professor também
tem que compreender como se ensinam os diferentes conteúdos.
Para cada
um deles, ou para cada bloco deles, há estratégias que se adequam melhor. Com
isto, aprende mais sobre como ensinar, pois pode generalizar o que aprende com
a atividade planejada para outras situações que vivencia diariamente na instituição.
Por fim, podemos também aprender com o exemplo desta educadora sobre como analisamos
e como aprendemos com o planejamento. Quando o professor escolhe uma atividade
para realizar com as crianças tem que ter clareza de suas intenções com ela
para que possa adequar suas ações e alcançar os objetivos propostos. Sendo
assim, ao conceber um planejamento é importante destacar:
1. O que
eu quero com esta atividade.
2. O que
eu quero que as crianças aprendam com esta atividade.
3. O que
eu preciso ensinar para que as crianças aprendam.
4. Como
eu devo desenvolver a atividade (incluindo antecipar ações e falas, os
materiais que pretendo utilizar e a organização do espaço), para que as crianças
construam os saberes propostos.
Todos os
itens que fazem parte do planejamento devem ter coerência entre si. Ou seja,
depois de planejar, posso voltar ao que escrevi e questionar: Com isto que direi
às crianças estou ajudando elas a aprenderem aquilo que espero? Tomando o
exemplo da educadora acima, se quero que as crianças formulem boas questões para
iniciar uma pesquisa, será que a melhor alternativa é começar pelas perguntas?
Com
tantas possibilidades de reflexão, de construção de conhecimento sobre a prática,
não há como negar a importância do planejamento na atuação do professor de
Educação Infantil. Não é mesmo?
* Beatriz Ferraz já foi dona de escola de Educação Infantil e criou o centro de estudos Escola de Educadores,
em São Paulo. Trabalhou com o Projeto Didática,
Informação, Cultura e Arte, de formação continuada, em São Caetano do
Sul, na Grande São Paulo (nos últimos três, atuando como coordenadora).
Em sua tese de doutorado, estuda o conhecimento profissional de
educadoras de creche com o objetivo de compreender o que aconteceu
quando o foco mudou do bem-estar para a Educação.
Heloisa Pedroza Lima 💕💕💕
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