E você professora de criança pequena, ainda insiste em distribuir todas aqueles desenhos xerocados iguaizinhos para suas crianças passarem um bom tempo colorido? 
Ainda acha que para a atividade ficar mais bonita é preciso um desenho no canto da página?
Tem medo de arriscar deixar os pequenos desenharem do jeito deles, por achar que eles não são capazes de figurar? E se ainda não figuram, você não entende porque?
Ainda não consegue enxergar a beleza dos traços e entender o que eles dizem?
Que pena, você está perdendo uma grande oportunidade de conhecer a capacidade criadora dos pequenos, entender como eles pensam, do que já são capazes, como sentem e percebem tudo a sua volta.
Experimente, deixe os pequenos desenharem. Enriqueça o universo de imagens deles, faça boas propostas de desenhos, diversifique os materiais, deixe que eles criem e observe seus traços, suas preferências, suas produções. Deixe que eles apresentem suas produções aos colegas, exponha em sala, valorize. 
Você vai se surpreender a cada dia.
A Evolução do Desenho Infantil
Autora: Thereza Bordoni
"Antes eu desenhava como Rafael,
mas precisei de toda uma existência
para aprender a desenhar como as crianças".
(Picasso)
Os  primeiros estudos sobre a produção gráfica das crianças datam do final  do século passado e estão fundados nas concepções psicológicas e  estéticas de então. É a psicologia genética, inspirada pelo  evolucionismo e pelo princípio do paralelismo da filogênese com a  ontogênese que impõe o estudo científico do desenvolvimento mental da  criança (Rioux, 1951).
As concepções de arte que permearam os  primeiros estudos estavam calcadas em uma produção estética idealista e  naturalista de representação da realidade. Sendo a habilidade técnica,  portanto, uma fator prioritário. Foram poucos os pesquisadores que se  ocuparam dos aspectos estéticos dos desenhos infantis.
Luquet (1927 -  França) fala dos 'erros' e 'imperfeições' do desenho da criança que  atribui a 'inabilidade' e 'falta de atenção', além de afirmar que existe  uma tendência natural e voluntária da criança para o realismo.
Sully  vê o desenho da criança como uma 'arte embrionária' onde não se deve  entrever nenhum senso verdadeiramente artístico, porém, ele reconhece  que a produção da criança contém um lado original e sugestivo. Sully  afirma ainda que as crianças são mais simbolistas do que realistas em  seus desenhos (Rioux, 1951).
São os psicólogos portanto, que no final  do século XIX descobrem a originalidade dos desenhos infantis e  publicam as primeiras 'notas' e 'observações' sobre o assunto. De certa  forma eles transpõem para o domínio do grafismo a descoberta fundamental  de Jean Jacques Rousseau sobre a maneira própria de ver e de pensar da  criança.
As concepções relativas a infância modificaram-se  progressivamente. A descoberta de leis próprias da psique infantil, a  demonstração da originalidade de seu desenvolvimento, levaram a admitir a  especificidade desse universo.
A maneira de encarar o desenho infantil evolui paralelamente.
Modo  de expressão próprio da criança, o desenho constitui uma língua que  possui vocabulário e sua sintaxe. Percebe-se que a criança faz uma  relação próxima do desenho e a percepção pelo adulto. Ao prazer do gesto  associa-se o prazer da inscrição, a satisfação de deixar a sua marca.  Os primeiros rabiscos são quase sempre efetuados sobre livros e folhas  aparentemente estimados pelo adulto, possessão simbólica do universo  adulto tão estimado pela criança pequena.
Ao final do seu primeiro  ano de vida, a criança já é capaz de manter ritmos regulares e produzir  seus primeiros traços gráficos, fase conhecida como dos rabiscos ou  garatujas ( termo utilizado por Viktor Lowenfeld para nomear os rabiscos  produzidos pela criança).
O desenvolvimento progressivo do desenho  implica mudanças significativas que, no início, dizem respeito à  passagem dos rabiscos iniciais da garatuja para construções cada vez  mais ordenadas, fazendo surgir os primeiros símbolos Essa passagem é  possível graças às interações da criança com o ato de desenhar e com  desenhos de outras pessoas. Na garatuja, a criança tem como hipótese que  o desenho é simplesmente uma ação sobre uma superfície, e ela sente  prazer ao constatar os efeitos visuais que essa ação produziu. No  decorrer do tempo, as garatujas, que refletiam sobretudo o prolongamento  de movimentos rítmicos de ir e vir, transformam-se em formas definidas  que apresentam maior ordenação, e podem estar se referindo a objetos  naturais, objetos imaginários ou mesmo a outros desenhos. Na evolução da  garatuja para o desenho de formas mais estruturadas, a criança  desenvolve a intenção de elaborar imagens no fazer artístico. Começando  com símbolos muito simples, ela passa a articulá-los no espaço  bidimensional do papel, na areia, na parede ou em qualquer outra  superfície. Passa também a constatar a regularidade nos desenhos  presentes no meio ambiente e nos trabalhos aos quais ela tem acesso,  incorporando esse conhecimento em suas próprias produções. No início, a  criança trabalha sobre a hipótese de que o desenho serve para imprimir  tudo o que ela sabe sobre o mundo. No decorrer da simbolização, a  criança incorpora progressivamente regularidades ou códigos de  representação das imagens do entorno, passando a considerar a hipótese  de que o desenho serve para imprimir o que se vê.
É assim que, por  meio do desenho, a criança cria e recria individualmente formas  expressivas, integrando percepção, imaginação, reflexão e sensibilidade,  que podem então ser apropriadas pelas leituras simbólicas de outras  crianças e adultos.
O desenho está também intimamente ligado com o  desenvolvimento da escrita. Parte atraente do universo adulto, dotada de  prestigio por ser "secreta", a escrita exerce uma verdadeira fascinação  sobre a criança, e isso bem antes de ela própria poder traçar  verdadeiros signos. Muito cedo ela tenta imitar a escrita dos adultos.  Porém, mais tarde, quando ingressa na escola verifica-se uma diminuição  da produção gráfica, já que a escrita ( considerada mais importante)  passa a ser concorrente do desenho.
O desenho como possibilidade de  brincar, o desenho como possibilidade de falar de registrar, marca o  desenvolvimento da infância, porém em cada estágio, o desenho assume um  caráter próprio. Estes estágios definem maneiras de desenhar que são  bastante similares em todas as crianças, apesar das diferenças  individuais de temperamento e sensibilidade. Esta maneira de desenhar  própria de cada idade varia, inclusive, muito pouco de cultura para  cultura.
Luquet Distingue Quatro Estágios:
1- Realismo fortuito:  começa por volta dos 2 anos e põe fim ao período chamado rabisco. A  criança que começou por traçar signos sem desejo de representação  descobre por acaso uma analogia com um objeto e passa a nomear seu  desenho. 
2- Realismo fracassado: Geralmente entre 3 e 4 anos tendo  descoberto a identidade forma-objeto, a criança procura reproduzir esta  forma. 
3- Realismo intelectual: estendendo-se dos 4 aos 10-12 anos,  caracteriza-se pelo fato que a criança desenha do objeto não aquilo que  vê, mas aquilo que sabe. Nesta fase ela mistura diversos pontos de vista  ( perspectivas ). 
4- Realismo visual: É geralmente por volta dos 12  anos, marcado pela descoberta da perspectiva e a submissa às suas leis,  daí um empobrecimento, um enxugamento progressivo do grafismo que tende  a se juntar as produções adultas. 
Marthe Berson distingue três estágios do rabisco:
1  - Estágio vegetativo motor: por volta dos 18 meses, o traçado e mais ou  menos arredondado, conexo ou alongado e o lápis não sai da folha  formando turbilhões. 
2 - Estágio representativo: entre dois e 3  anos, caracteriza-se pelo aparecimento de formas isoladas, a criança  passa do traço continuo para o traço descontinuo, pode haver comentário  verbal do desenho. 
3 - Estágio comunicativo: começa entre 3 e 4  anos, se traduz por uma vontade de escrever e de comunicar-se com  outros. Traçado em forma de dentes de serra, que procura reproduzir a  escrita dos adultos. 
Em Uma Análise Piagetiana, temos:
1 -  Garatuja: Faz parte da fase sensório motora ( 0 a 2 anos) e parte da  fase pré-operacional (2 a 7 anos). A criança demonstra extremo prazer  nesta fase. A figura humana é inexistente ou pode aparecer da maneira  imaginária. A cor tem um papel secundário, aparecendo o interesse pelo  contraste, mas não há intenção consciente. Pode ser dividida em: 
•  Desordenada: movimentos amplos e desordenados. Com relação a expressão,  vemos a imitação "eu imito, porém não represento". Ainda é um exercício.
•  Ordenada: movimentos longitudinais e circulares; coordenação  viso-motora. A figura humana pode aparecer de maneira imaginária, pois  aqui existe a exploração do traçado; interesse pelas formas (Diagrama).
Aqui  a expressão é o jogo simbólico: "eu represento sozinho". O símbolo já  existe. Identificada: mudança de movimentos; formas irreconhecíveis com  significado; atribui nomes, conta histórias. A figura humana pode  aparecer de maneira imaginária, aparecem sóis, radiais e mandalas. A  expressão também é o jogo simbólico.
2 - Pré- Esquematismo: Dentro da  fase pré-operatória, aparece a descoberta da relação entre desenho,  pensamento e realidade. Quanto ao espaço, os desenhos são dispersos  inicialmente, não relaciona entre si. Então aparecem as primeiras  relações espaciais, surgindo devido à vínculos emocionais. A figura  humana, torna-se uma procura de um conceito que depende do seu  conhecimento ativo, inicia a mudança de símbolos. Quanto a utilização  das cores, pode usar, mas não há relação ainda com a realidade,  dependerá do interesse emocional. Dentro da expressão, o jogo simbólico  aparece como: "nós representamos juntos". 
3 - Esquematismo: Faz  parte da fase das operações concretas (7 a 10 anos). Esquemas  representativos, afirmação de si mediante repetição flexível do esquema;  experiências novas são expressas pelo desvio do esquema. Quanto ao  espaço, é o primeiro conceito definido de espaço: linha de base. Já tem  um conceito definido quanto a figura humana, porém aparecem desvios do  esquema como: exagero, negligência, omissão ou mudança de símbolo. Aqui  existe a descoberta das relações quanto a cor; cor-objeto, podendo haver  um desvio do esquema de cor expressa por experiência emocional. Aparece  na expressão o jogo simbólico coletivo ou jogo dramático e a regra. 
4  - Realismo: Também faz parte da fase das operações concretas, mas já no  final desta fase. Existe uma consciência maior do sexo e autocrítica  pronunciada. No espaço é descoberto o plano e a superposição. Abandona a  linha de base. Na figura humana aparece o abandono das linhas. As  formas geométricas aparecem. Maior rigidez e formalismo. Acentuação das  roupas diferenciando os sexos. Aqui acontece o abandono do esquema de  cor, a acentuação será de enfoque emocional. Tanto no Esquematismo como  no Realismo, o jogo simbólico é coletivo, jogo dramático e regras  existiram. 
5 - Pseudo Naturalismo: Estamos na fase das operações  abstratas (10 anos em diante)É o fim da arte como atividade espontânea.  Inicia a investigação de sua própria personalidade. Aparece aqui dois  tipos de tendência: visual (realismo, objetividade); háptico ( expressão  subjetividade) No espaço já apresenta a profundidade ou a preocupação  com experiências emocionais (espaço subjetivo). Na figura humana as  características sexuais são exageradas, presença das articulações e  proporções. A consciência visual (realismo) ou acentuação da expressão,  também fazem parte deste período. Uma maior conscientização no uso da  cor, podendo ser objetiva ou subjetiva. A expressão aparece como: "eu  represento e você vê" Aqui estão presentes o exercício, símbolo e a  regra. 
E ainda alguns psicólogos e pedagogos, em uma linguagem mais coloquial, utilizam as seguintes referencias:
• De 1 a 3 anos
É  a idade das famosas garatujas: simples riscos ainda desprovidos de  controle motor, a criança ignora os limites do papel e mexa todo o corpo  para desenhar, avançando os traçados pelas paredes e chão. As primeiras  garatujas são linhas longitudinais que, com o tempo, vão se tornando  circulares e, por fim, se fecham em formas independentes, que ficam  soltas na página. No final dessa fase, é possível que surjam os  primeiros indícios de figuras humanas, como cabeças com olhos.
• De 3 a 4 anos
Já  conquistou a forma e seus desenhos têm a intenção de reproduzir algo.  Ela também respeita melhor os limites do papel. Mas o grande salto é ser  capaz de desenhar um ser humano reconhecível, com pernas, braços,  pescoço e tronco.
• De 4 a 5 anos
É uma fase de temas  clássicos do desenho infantil, como paisagens, casinhas, flores,  super-heróis, veículos e animais, varia no uso das cores, buscando um  certo realismo. Suas figuras humanas já dispõem de novos detalhes, como  cabelos, pés e mãos, e a distribuição dos desenhos no papel obedecem a  uma certa lógica, do tipo céu no alto da folha. Aparece ainda a  tendência à antropomorfização, ou seja, a emprestar características  humanas a elementos da natureza, como o famoso sol com olhos e boca.  Esta tendência deve se estender até 7 ou 8 anos.
• De 5 a 6 anos
Os  desenhos sempre se baseiam em roteiros com começo, meio e fim. As  figuras humanas aparecem vestidas e a criança dá grande atenção a  detalhes como as cores. Os temas variam e o fato de não terem nada a ver  com a vida dela são um indício de desprendimento e capacidade de contar  histórias sobre o mundo.
• De 7 a 8 anos
O realismo é a marca  desta fase, em que surge também a noção de perspectiva. Ou seja, os  desenhos da criança já dão uma impressão de profundidade e distância.  Extremamente exigentes, muitas deixam de desenhar, se acham que seus  trabalhos não ficam bonitos.
Como podemos perceber o linha de  evolução é similar mudando com maior ênfase o enfoque em alguns  aspectos. O importante é respeitar os ritmos de cada criança e permitir  que ela possa desenhar livremente, sem intervenção direta, explorando  diversos materiais, suportes e situações.
Para tentarmos entender  melhor o universo infantil muitas vezes buscamos interpretar os seus  desenhos, devemos porem lembrar que a interpretação de um desenho  isolada do contexto em que foi elaborado não faz sentido.
É  aconselhável, ao professor, que ofereça às crianças o contato com  diferentes tipos de desenhos e obras de artes, que elas façam a leitura  de suas produções e escutem a de outros e também que sugira a criança  desenhar a partir de observações diversas (cenas, objetos, pessoas) para  que possamos ajudá-la a nutrisse de informações e enriquecer o seu  grafismo. Assim elas poderão reformular suas ideias e construir novos  conhecimentos.
Enfim, o desenho infantil é um universo cheio de mundos a serem explorados.
Fonte: http://dani-brincandoeaprendendo.blogspot.com/
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